A escolha estratégica da tecnologia é determinada ou é determinante para o sucesso do empreendimento?

15 20É bem conhecido na literatura de inovação o conceito de “Technology S-curve” (Curva S de Tecnologia, algumas vezes também chamada de Curva S de Inovação), que é uma maneira de representar o ciclo de vida de uma tecnologia e inovações incrementais, disruptivas e radicais. A Figura 1 à frente mostra o que a Technology S-curve revela.

Suponha que no eixo vertical do gráfico seja mostrado o desempenho de um item em consideração, que é muitas vezes considerado como uma vantagem competitiva de empresas. No eixo horizontal é mostrado o esforço associado – que pode ser tempo, P&D ou similar. A S-curve mostra a tecnologia nos seus estágios iniciais quando ela evolui de forma lenta, até que um avanço acontece e ela passa por uma fase de aceleração até amadurecer, e, finalmente, estabiliza-se ao longo do tempo. À medida que amadurece, a tecnologia atinge seu limite tecnológico de utilidade ou vantagem competitiva. Em algum ponto, há uma forte mudança na tecnologia – uma inovação radical – que resulta numa nova S-curve.

Em recente trabalho publicado pelo National Bureau of Economic Research – NBER dos EUA, economistas observaram um paradoxo relacionado à Technology S-curve. Enquanto, por um lado, a Technology S-curve é tomada como um fenômeno empírico que na sua essência é tecnologicamente determinado, o argumento justificando o formato da S-curve depende de escolhas estratégicas como um balanço entre atividades de exploration (investigação, pesquisa) e exploitation (execução, otimização). Mas, se, por outro lado, as S-curves são um fato “ambiental”, então por que essas escolhas estratégicas importam? Alternativamente, se elas (as curvas) são o resultado de escolha estratégica, por que elas aparecem como um fenômeno empírico sistemático? Dito de outra forma, é o papel da estratégia empreendedora informar os empreendedores à medida que eles selecionam, e, daí, “passeiem/surfem” numa trajetória de tecnologia emergente? Ou, uma estratégia empreendedora robusta necessita entender como as escolhas estratégicas do empreendedor irão conformar a própria trajetória da tecnologia emergente?

Os autores do trabalho tomam como evidência desse paradoxo o caso da indústria de veículos elétricos no final dos anos 2000, e as estratégias contrastantes são as das startups Better Place e Tesla. De um lado, ambas Better Place e Tesla partiram da premissa de inovação estratégica no potencial da aplicação de baterias de íons de lítio, que eram amplamente percebidas como estando atravessando significativos avanços tecnológicos.

No domínio das baterias de íons de lítio, o fundador da Better Place (Shai Agassi) focou rapidamente no potencial de exploitation da tecnologia existente da bateria de íons de lítio. Enquanto a ainda emergente tecnologia tinha significativas limitações, incluindo altos custos e baixo armazenamento de energia (de forma que o alcance seria limitado e os tempos de recarga mais longos), Agassi priorizou o desenvolvimento de uma bateria permutável, em que os consumidores poderiam simplesmente substituir as baterias em poucos minutos numa estação de renovação, mais do que necessariamente ter que esperar enquanto a bateria fosse recarregada. Este foco pragmático no curto prazo permitiu a Better Place estabelecer parcerias com montadoras tradicionais de automóveis, financiar infraestrutura regional (ex., estações de renovação ao longo de todo território de Israel), e introduzir um veículo elétrico em 2012.

Em contraste, Elon Musk reconheceu a mesma ampla oportunidade e selecionou a mesma trajetória tecnológica emergente (baterias de íons de lítio). No entanto, ao contrário da Better Place, a Tesla perseguiu um enfoque fundamentalmente diferente de gestão de inovação, priorizando exploration ao invés de exploitation, com duas características chave. Primeiro, Musk implementou um deliberado passo a passo de modelo de introdução. Levando em conta as deficiências existentes na ainda nascente tecnologia de baterias, Musk introduziu o Roadster, um veículo de luxo, onde o preço não era um fator chave na decisão de compra. A experiência de desenvolver o Roadster capacitou a Tesla a explorar o desenvolvimento continuado da tecnologia de bateria de íon de lítio, a levar vantagem do learning-by-doing do processo de desenvolvimento, e, em última instância, a beneficiar-se de economias de escala (ex., através da integração vertical na manufatura de baterias na Giga Factory). De 2010 chegando até 2018, os custos da bateria de íons de lítio caíram 90 por cento, possibilitando aumentos em energia, densidade de força e alcance de veículo.

Apesar de ambas Better Place e Tesla terem perseguido a mesma oportunidade tecnológica emergente (ao mesmo tempo, mesma indústria, e domínio de aplicação), suas habilidades em alavancar a emergente inovação tecnológica como uma fonte de vantagem competitiva divergiram. Depois de um lançamento inicial em 2012 que encontrou um baixo nível de demanda (menos de 1500 veículos foram vendidos pela Better Place), a empresa foi incapaz de sair do seu enfoque orientado à exploitation e levar vantagem das melhorias emergentes desenvolvidas pela Tesla. Em contraste, a estratégia de longo prazo da Tesla, de um enfoque de exploration com um foco no segmento de veículos de luxo, a permitiu desenvolver e comercializar o Modelo 3 Sedan em 2018. Apesar de mais de US$ 1 bilhão em investimento na Better Place, a iniciativa foi liquidada em 2013, enquanto a Tesla foi capaz de “ride the S-curve” (surfar na curva S) para emergir como o produtor líder de carros elétricos para economias desenvolvidas tais como os EUA e a Europa.

Logo, ao observarem essas duas trajetórias (a da Better Place de “low exploration and high exploitation”, e a da Tesla de um período mais longo e mais intensivo da fase de exploration), os autores se dispuseram a conhecer melhor as escolhas que startups se confrontam em escolher suas tecnologias ao resolver o paradoxo da Technology S-curve através da reformulação dos fundamentos da própria Technology S-curve.

Segundo eles, enquanto a maioria da pesquisa em inovação e estratégia trata a Technology S-curve como dada (por exemplo, uma trajetória tecnológica vir a ser disruptiva ou não), os autores reformulam a estratégia tecnológica através de um “arcabouço baseado em escolha” em que a S-curve entendida/percebida por uma dada startup depende das escolhas dos seus fundadores. Ou seja, os autores reconceituam a Technology S-curve não como tecnologicamente dada, mas como um envelope de potenciais resultados derivado da escolha estratégica, e explicitamente levam em consideração a escolha tecnológica que os empreendedores tomam. Esta perspectiva sugere que o fator limitante conformando a performance da inovação de longo prazo não são os limites físicos fundamentais, mas sim a própria estratégia!

Em resumo, o recado dos autores é simples. Ao invés de focarmos em como dividir o esforço e a atenção entre tecnologias, o enfoque sugerido por eles é o de enfatizar a importância das escolhas ativas (portanto, estratégicas) de conformar a própria evolução da tecnologia (ou seja, a escolha de quando adotar um foco mais orientado à exploration versus um mais orientado à exploitation)! E este enfoque dos autores nos remete à questão dos Portfólios de Modelos de Negócios que tratamos aqui nas newsletters de 05-05-2019 e 17/05/2020, onde essas questões de exploration e exploitation são decisões estratégicas cruciais para o sucesso nos negócios nos dias atuais!

Se sua empresa, organização ou instituição deseja saber mais sobre escolhas estratégicas de tecnologia, não hesite em nos contatar!

 

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